18 fevereiro, 2009

"Porque a maior dor do vento é não ser colorido.... "

Mário Quintana

17 fevereiro, 2009

O que você ouve?

O que você ouve quando tudo está quieto?

Eu tenho insônia. Me lembro de já ter falado isso...

Eu tenho insônia porque as vozes e as personalidades que moram dentro da minha cabeça ficam conversando comigo o tempo todo. Mas quando tá silêncio, elas falam mais alto... são umas intrometidas.

A questão é que eu procurei uma neurologista... ( pensei em arrancar as vozes de lá com cirurgia?)
Eu queria ir para o Instituto do sono. Já ouviu falar? É um local em que você dorme e todo mundo assiste. Por fora e por dentro... ficam monitorando sua cabeça... ou a eletricidade que tá rolando lá dentro.

Será que eles iriam conseguir ver as minhas vozes?... capaz até de eles lhes darem rostos... (olha, essa que fica falando que nada tá bom... ela é mais velha, meio amarga, se veste mal...)
Vai saber? Rostos pras minhas vozes.

E se as vozes tivessem todas a minha cara?!?!?!
Umas mais despenteadas... ou com olheiras maiores... outras lindas, perfumadas, com unhas feitas...

Eu não falei nada disso pra neuro. Só falei que tinha insônia.

- Tenho insônia

- Você já tentou cortar o café? Seu quarto é escuro e silencioso?

( O quarto é. Minha cabeça é que não é!)

- É sim! Café? Só tomo até às três da tarde....

- Certo. Podemos fazer uma Ressonância magnética

( vão ver a cara das vozes!)

- Eu pensei em ir ao Instituto do sono...

- Podemos tentar isso em um segundo momento...

Não fiz a ressonância magnética e nem voltei na neuro. Por quê? Sei lá!

A questão é que fui fazer Yoga! Meditação, respiração... talvez ajude!

Numa das primeiras aulas, depois das posturas tradicionais, o exercício era olhar para a chama de uma vela e se concentrar somente na chama. Nada mais. Esvaziar a cabeça... se desprender dos pensamentos... focar a chama.

Isso mesmo! Era o que eu precisava. Concentração! Vazio de pensamentos...

Comecei a olhar para vela. A pensar na vela. A pensar em não pensar... a pensar que eu devia estar pensando na vela e não pensando no trabalho, que eu devia ter ligado para o mecânico anteontem mas aquele roteiro tá com a cabeça de abertura meio longa... A vela! vela... voltando-me a vela... mas aquilo que ele falou... não precisava ser daquele modo... ele pensa o que... a vela... estou pensando na vela... Estou pensando que devo estar pensando na vela... Será que estar pensando que você não deve estar pensando, é pensar?

Meu olho tá ardendo um pouco com essa luz da chama direto...

Em casa. Na cama. Pensei em não pensar... pensei na vela... vi que é mais difícil sem uma vela real na frente.
Pensei se estar pensando em não pensar já era pensar... Passou mais três horas.

Desisti de insistir na Yoga, apesar de continuar praticando, mas agora meu objetivo é encostar o pé na testa!

Fui à um psiquiatra. É isso. Vou tomar remédio. Dane-se a alternativa saudável. Dane-se.

- Olá. eu tenho insônia!

- Fale –me de você... seu pai... sua mãe... seu namorado.. seu trabalho...

( O problema é que todos eles conversam comigo, quando eu fecho a luz do quarto... e eu não sei se são eles ou eu dividida, transformada em todos eles... que fala comigo... por que eu discuto comigo e com a outra que mora dentro de mim.. .tem dias em que são cinco, seis, uma mesa de bar inteira batendo boca... tanto que eu nem chego a escutar a buzinada do mal educado atrás de mim... )

- Olha, os problemas normais... acho que está tudo bem.. a questão da insônia... se eu não ficasse tão cansada durante o dia... mas é que minha cabeça não pára...

Celso Azevedo. O nome do médico. Ótimo, incrível... me ouviu com paciência... todas as 37 eu... e falou que é muito importante dormir bem... e que hoje existem muitas alternativas, remédios ótimos, feitos sob medida para cada problema, cada personalidade perturbada diferente... por isso ele queria me conhecer tão bem... para achar o remédio sob medida...

Saí de lá feliz com uma receita na mão.

Remédio para Esquizofrenia.

- Ele é para esquizofrenia, mas em dosagens mais baixas é perfeito para o seu caso.

Esquizofrenia?
Não é aquela doença em que se ouve vozes?

Mas elas vão morrer? Você vai matar as minhas vozes? Todas elas?

Comprei o remédio.

“Indicações, contra-indicações, ações esperadas do medicamento. Vida bula”

*Nota: Quando exposta à luz, Melleril solução oral fica azul. Essa alteração de cor é reversível no escuro e não tem influência sobre a atividade ou tolerabilidade do produto.

Estou tomando comprimidos... talvez a cor não seja um problema pra mim...

Indicações: Sintomas variados de distúrbios mentais psicóticos e não-psicóticos graves, estes caracterizados por agitação, depressão com agitação e distúrbios do sono. MELLERIL é particularmente útil: em pacientes psicóticos crônicos hospitalizados; em pacientes psicóticos ambulatoriais; em pacientes geriátricos com agitação, ansiedade ou estados combinados de ansiedade e depressão graves, geralmente associados com graus variados de síndrome cerebral orgânica; durante supressão do álcool, para o alívio de sintomas como ansiedade, agitação, hostilidade ou alucinações;

Alucinações?

A realidade anda sendo algo muito complexo pra mim... principalmente porque eu não sei o que é e o que não é. Ou o que ela não é.

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E você? O que você ouve quando tudo está quieto?

16 fevereiro, 2009

Palavras não existem.
São só um punhado de letras alinhadas de forma arbitrária.

Pra que deixa-las?
Pra que fala-las?

Escrever? Pra quê?

O importante é respirar fundo.

03 fevereiro, 2009

Sobre o Adeus II

Sobre o post dos bilhetes de suicídio...
Pessoas comentaram comigo sobre ele.
Perguntaram se eu já tinha lido vários bilhetes... ( já, já li vários. a maioria publicados)

E ficaram curiosas...

Ok, vou postar um aqui, um que me chamou especial atenção por ser um bilhete muito atípico. Triste, doído. Mas simples, sutil... Quase sem pretensão.

Ele foi deixado por um homem. 56 anos. que era carcereiro ( pela profissão, parece que foi um homem simples)

Ele se matou com disparo de arma de fogo. E a mensagem estava datilografada

"Dr. ou Dra.
1- Eu era alcoólatra
2- Fui internado três vezes
3- Estou em tratamento no serviço de Psiquiatria há sete anos.
4- Porem fazem cinco anos que eu parei de beber, não bebo bebida alcoólica nenhuma, mas nem cerveja.
5- Eu vinha bem durante esse tempo (os cinco anos) estava tomando o haldol e o fenergan.
6- Mas o ano passado (agosto ou setembro) tive uma pequena recaída, andava um pouco nervoso, dormindo pouco e tremia um pouco as mãos.
7- A médica trocou os remédios o haldol e o fenergan para o neozine de 100, mas o neozine de 100 me dá um pouco de sono há mais.
8- Agora eu tive esta recaída, mas não foi por causa da bebida, porque realmente fazem cinco anos que eu não bebo nada mesmo."


Esse bilhete foi retirado de uma tese sobre o tema


SUICÍDIO - TRAMA DA COMUNICAÇÃO
Dissertação de Mestrado, 1992, Psicologia Social, PUC-SP
Autor: Marcimedes Martins da Silva