Todo
mundo que o conhece repara antes nos olhos azuis. Todo mundo fala: “os olhos
azuis dele são lindos.”
Os
olhos azuis não foram a primeira coisa que eu reparei. Nem a segunda.
Reparei
primeiro no rosto comprido, equino.
Depois
no cabelo sem corte. Desregrado.
Em
terceiro, reparei como tocava violão e cantava bem. Reparei, principalmente, na
voz grave.
Minha
voz sempre foi irritantemente aguda. A voz dele é grave quando canta.
Depois
que fomos morar juntos passei a reparar muito nas mãos e nos pés. Nos dedos. Nas
unhas. Nos pelinhos que ficam nas falanges. Sabe, os pelinhos?
Reparo
como os pés se esticam. Como as mãos se movem. Dedos compridos, magros. Como os
meus.
Não
sei se antes reparei que estava apaixonada. Ou se reparei primeiro que já o
amava. Lembro sim que, no começo, tive medo que ele me deixasse.
Depois,
tive medo de querer deixa-lo.
Agora
não reparo mais nisso. Mas reparo no modo como ele fala devagar. Devagar
demais. E isso me irrita. E eu brigava, gritava, desesperava com minha voz
aguda.
A voz
grave e lenta dele não se alterava. Aprendi a conviver. Aprendi a admirar. E
tenho aprendido a amar a fala lenta.
Depois
reparei que ele deixava os papeizinhos prateados do maço de Marlboro espalhados pela casa. E que não levava o prato pra pia. E que não limpava o cinzeiro.
E
reparei também que ele prepara um café da manha delicioso. E faz café. E pão na
chapa. E também me carrega pra cama, quando adormeço na TV.
Ando
reparando que estou mudada. Ando pesquisando preços de apartamento. Brincando com crianças dos outros. E
criticando menos vestidos e véus brancos.
Ando
reparando também, com misto de pânico e prazer, que os fins de semana são menos
sobre mim. E mais sobre nós.
Mas
sabe que eu não gostei muito no que reparei esses dias? Que ele foi
no cabeleireiro. E que o corte de cabelo
está mais regrado.
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