12 fevereiro, 2014

Estrada

É porque as vezes penso em pegar a estrada e partir.
Deixar um bilhete apenas. Um bilhete só, para todos que amo
Um bilhete que não diga nada demais. Não será eterno como os bilhetes de suicídio.
Será um bilhete que só diga o óbvio: “fui, e não sei quando volto”
Acho que a densidade dessa cidade, essa dencidade, nos faz sentir vida estacionada.
Sinto que meu sangue corre lento, como a 23 de Maio.
Na estrada vida flui. Na estrada, vida vai.

Prevejo que se mudar de lugar posso dar um restart. Teria uma chance de ser outra.
Prevejo que numa fazenda teria paz para pescar as palavras que aqui me escapam.
Prevejo que num país pequeno teria gana de sonhar grande.
Prevejo que numa praia, alcançaria a força que invejo.
Prevejo que perdida, desenharia um caminho no chão.

Se essa São Cidade nos empurra para um lado, para apertar do outro.
A estrada nos empurra para.
Sentiria medo?
Cansaço?
Talvez saudades.

Mas a questão é quando. Quando escreverei o bilhete e partirei?
Porque a São Cidade me prende pelo tornozelo. Como uma rede de pesca enrolada em um bicho. Ela está afogando.

Cada vez que o alarme toca às 08h. Foi um dia que fiquei.
Cada vez que dou a partida, e paro no vermelho. Foi um dia que fiquei.
Cada vez que me ligam pedindo algo para ontem. Foi um dia que fiquei.
Cada vez que não fiz o que devia. Foi um dia que fiquei.
E cada vez que fiz, e só fiz o que é preciso. Foi um dia que fiquei.

Mas tem um algo. Uma coisa só. Um pessoa. A pessoa rede. A pessoa que aperta. Me aperta e que eu fico. A pessoa que me abraça depois que o alarme toca. Ela mesma. A pessoa que está sentada ao lado quando dou a partida e paro no vermelho. O porquê não parto. Porque não peito. Porque não pasto. Porque não vago. Porque paro.

Por que não atalho?


E o bilhete não escrito ainda existe. Sempre existe. O bilhete sem tinta. O bilhete que não deixo em cima da mesa. O bilhete que não foi. O bilhete que não fui.

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